08 setembro, 2023

desfecho

Rio de Janeiro, 12 de junho de 2019.

Amado,

Acho que eu deveria saber pela expressão em seu rosto que você jamais seria capaz de esconder meu segredo. A verdade corta como uma adaga, tem certeza que você quer ouvir? Eu acho que nunca estive pronta.

Eu teria entrado na igreja por você, teria sorrido durante horas e cumprimentado cada um dos familiares que me odiavam. Eu poderia ser a mãe dos seus filhos e ter continuado a usar aquela aliança feita sob medida para outro dedo. Eu poderia fingir que meu amor por você era o mesmo de antes e ignorar todos os meus desejos ocultos.

Sete anos sem mim não é o mesmo que sete anos comigo, você sabe disso, né? E nem mil estrelas com o seu nome seriam capazes de me fazer ficar. Se liberte desse sentimento, pois nada me faria mudar de ideia.Se eu tivesse apenas me retirado da sua vida, você teria aceitado?
Se eu tivesse sido honesta contigo, você poderia ter feito o mesmo?
Será que algum dia você vai aceitar sua parcela de culpa ou vai continuar despejando ela apenas em mim?

Desculpe, mas você deixou de ser minha prioridade quando sentou confortavelmente naquela cadeira cinza e me observou fazer todas as coisas que você deveria ter feito por nós. O papel de vítima nunca combinou comigo e você soube aproveitar disso muito bem, agindo como se seu amor devesse ser celebrado. E então, quando me libertei, te deixei em ruínas, mas não sem antes desmoronar também...

A minha dor cabe perfeitamente na palma das suas mãos gigantescas. Então, eu sento e te observo brincar comigo feito uma marionete, atendendo aos seus desesperos noturnos e te ouvindo ler cartas de repúdio sobre mim enquanto eu observava a caixa de remédios, me perguntando quantos daqueles seriam necessários.

Eu apenas tentei me segurar em algo enquanto eu caía do precipício, mas onde estavam meus amigos? Eu caí do pedestal que você construiu para mim e quebrei em mil partes. Perdi as contas de quantas vezes precisei varrer os cacos de mim que estavam espalhados pela casa que era nossa.

Eu sento e te observo vestir a capa do homem traído, rodeado pelos amigos que eram meus, enquanto você conta a eles o quão ingênuo você foi por me amar. E eu concordo com cada palavra, porque acho tudo isso pouco para alguém que te fez chorar. Eu ignoro as vezes que vi sua sombra me seguir pelas ruas da cidade; ignoro as palavras cruéis despejadas em momentos de fúria; ignoro todos as bandeiras vermelhas que balançam na minha janela.

Eu aceitei o papel de vilã porque achei que seria melhor pra você. Cadê meu oscar? Uma atuação impecável dessas merece um prêmio, não? Eu me mantive firme ao dizer "não" repetidas vezes quando me implorou para voltar, não me perdi no personagem. Você teve seu desfecho, afinal. E logo eu, que não sou dada a "felizes para sempre", fui a vilã dessa narrativa totalmente manipulada. Eu assumi meus erros e arquei com as consequências. Será que você pode dizer o mesmo? Será que aquele anel servirá na terceira vítima do seu amor doentio?

Eu dei tudo de mim enquanto esperava sua retribuição, e você ainda tem coragem de me perguntar por que eu desisti de nós? Você é um tolo. Um amor como esse não acaba do dia da noite, amado, ele morre aos poucos... Seu erro foi estar ocupado demais, andando com muletas e se queixando sobre a vida, fazendo mil promessas de um futuro tão distante.

Esse é o meu desfecho, sou eu dizendo que sim, o problema também era você. E aquela velha sensação familiar de finalmente dizer a coisa certa na hora certa toma conta de mim de novo.

Eu sento e te observo seguir em frente com a sua reputação intocável, enquanto eu me justifico para pessoas que eu nem conheço. Mas eis aqui uma promessa: jamais ser tão ingênua ao ponto de esquecer de ser cuidadosa comigo. Aprendemos uma importante lição juntos... amar não é mesmo suficiente.

Isso não é mais um "até breve", é um desfecho.

Atenciosamente,

minha nova versão

verão cruel

Viçosa, 28 de julho de 2018.

Amado,

Meu mundo inteiro era composto por nós dois. A promessa de viver um grande amor me cegou, me fez ignorar completamente a tempestade que eu sabia que viria em algum momento. Mas eu sabia que dessa vez era real e não te deixaria partir novamente... E mesmo que te dissessem pelos corredores que eu seria uma pessoa má, meu papel era provar que eles estavam completamente errados.

Me pergunto se você seria capaz de me deixar um dia, quando a pergunta certa seria "mas poderia, você, ficar?". Perambulei como um fantasma durante a noite, procurando pelo seu lado obscuro, afinal de contas, eu desconheço histórias de amor com finais felizes, principalmente se eu for a protagonista. Eu poderia ser dramática e agir como uma princesa que precisa ser salva, mas esse papel não combina comigo, lembra? eu geralmente interpreto monstros ou heroínas mal compreendidas pela audiência. 

Qual é a sensação de ser idolatrado? Eu realmente queria saber o segredo para tanto brilho. Ao invés disso, tenho meu merecimento questionado e sou chamada de grossa quando sou assertiva demais. Se eu fosse um homem amado por todos, como você, talvez o final dessa história tivesse sido um pouco diferente, não acha? Eu acho que você sabe que sim.

Eu estou mais apaixonada por você agora do que quando tínhamos apenas 16 anos. E enquanto brincamos de casinha, minto para mim mesma dizendo que tenho tudo sobre controle. "Está tudo bem", minto para você também, mas de noite acordo gritando ao ter pesadelos. 

Somos loucos por acreditar que daria certo? Por que eu tive que quebrar o que eu amo tanto?

Ainda me lembro daquele verão na cachoeira e de como eu pensei que seria pra sempre. Lembro dos espaços vazios que preenchemos na casa nova e de pensar que seria difícil estar ali sem você. Será que eu fui tola por achar que foi tempo suficiente para tomar uma decisão tão importante assim? Mas agora que eu disse "sim", as coisas nunca mais serão as mesmas... e esse é o tipo de desgosto que o tempo nunca será capaz de consertar.

Até breve,
Linda

fale agora ou cale-se para sempre

Viçosa, 07 de dezembro de 2017.
Querido,

Poderíamos voltar naquele mês de dezembro em que você me prometeu jamais soltar as minhas mãos? Ou melhor, podemos voltar no exato instante em que pensei que você era a melhor coisa que já foi minha? Você pode acreditar nisso agora?

Eu queria voltar, mas não para acreditar em um falso futuro de contos de fadas, com reis e rainhas. Eu queria voltar, poder dizer para aquela moça jovem que algumas tragédias podem ser evitadas. Eu posso falar com ela agora, dizer que sou o tipo de garota que interrompe planos e impede desastres. Eu diria para que ela fugisse, se escondesse atrás das cortinas, inventasse uma desculpa e se curasse sozinha. Teria sido melhor, não teria? Será que eu posso acreditar nisso agora?

Mas ela estava ferida, e você a tirou do chão nas incontáveis vezes em que conseguiram a derrubar. E eu, ingenuinamente, pensei que ela jamais seria capaz de levantar sem a sua ajuda. Se eu tivesse acreditado um pouquinho mais em mim, será que teríamos durado tanto tempo? Se eu tivesse me blindado e escutado mais as pessoas ao meu redor, teria o nosso amor durado 4 natais?

Eu posso te ver daqui a alguns anos na fila dos correios, que irei me perguntar "quantos dias cabem em 4 anos?". Você vai me olhar "discretamente" e me responder, sem abrir a boca, que apesar de ocupar tão rapidamente meu lugar, você nunca se esqueceu o quão grande eu posso ser.

Eu tomo decisões precipitadas quando me apaixono, e aquele mês de dezembro volta na minha cabeça como um karma... um ciclo que só seria interrompido tantos anos depois. Mesmo assim, será que essa escolha é a melhor de todas? Parece que sempre vai ter alguém para desaprovar o que eu decidir.

Não há mais nada a ser feito, pois os fantasmas do passado pularam em mim sem que eu pudesse reagir como deveria. Pessoas especulam sobre mim e sobre como eu lido com as coisas, mas elas não sabem como é difícil desviar das pedras que me atiram. E foi exatamente ali que eu senti meu castelo desmoronar...

Eu nunca quis que você me odiasse, mas entendo e acolho o papel de monstro que você sabiamente esolheu pra mim. Eu te decepcionei, é nítido, mas entenda que eu não sei como isso poderia ter terminado de outra forma.

Atenciosamente,
Bichim